As pesquisas de Jung sobre o simbolismo das mandalas provêm da sua vasta vivência terapêutica com seus pacientes, de inúmeros materiais colhidos na prática analítica. Neste artigo em especial, diante deste vasto material espontâneo, rico de conteúdo, o autor da Psicologia Analítica identificou uma relação das mandalas espontâneas com as crises interiores que seus pacientes estavam atravessando. Como fenômeno psicológico, Jung diz que as mandalas aparecem espontaneamente em sonhos, em certos estados conflitivos e na esquizofrenia.
Para Dibo, o surgimento de imagens circulares – mandalas, nos sonhos e na imaginação ativa simbolizam a integridade natural da psique, sua totalidade, possuindo eficácia na conservação da ordem psíquica se essa ordem já existe ou possibilitando o reestabelecimento da ordem onde ela desapareceu.
Esses “estranhos‟ símbolos levaram Jung a perceber a profundidade do sentido psicológico que tais imagens forneciam. É por esta razão, que o tema “mandala‟ é encontrado nas obras complementares de Jung. Ele utiliza a mandala para designar uma representação simbólica da psique, que sintetiza toda sua obra. As mandalas surgem com diversas formas e desenhos, porém há elementos e formatos regulares: circular, elaborada como flor, centro figurado pelo Sol; estrela, cruz, geralmente de quatro, oito ou doze raios; esferas cruciformes frequentemente em rotação; serpente enrolada circularmente ou espiralada em torno de um centro; castelo, cidade, pátio quadrado ou circular.
(...) Seu tema básico é o pressentimento de um centro da personalidade, por assim dizer um lugar central no interior da alma, com o qual tudo se relaciona e que ordena todas as coisas, representando ao mesmo tempo uma fonte de energia. A energia do ponto central manifesta-se na compulsão e ímpeto irresistíveis de tornar-se o que se é, tal como todo organismo é compelido a assumir aproximadamente a forma que lhe é essencialmente própria. Este centro não é pensado como sendo o eu, mas se assim se pode dizer, como o si-mesmo (JUNG, 2012, p.361).
Aqui está o tema básico levantado pelas mandalas: a existência de um centro no interior da alma. Neste centro todas as coisas estão relacionadas, ele ordena tudo. Ao mesmo tempo é a fonte de energia, força interior que se manifesta conforme comenta Jung, como um ímpeto (impulso, força intensa) de tornar-se o que se é de fato, assumindo a própria essência. A meu ver, o que Jung está dizendo é: que uma árvore seja uma árvore, que um gato seja um gato, ou seja, que cada organismo é chamado a assumir o que é de sua essência, e assim, desenvolver suas potencialidades.
(...) embora o centro represente, por um lado, um ponto mais interior, a ele pertence também, por outro lado, uma periferia ou área circundante, que contém tudo quando pertence ao si-mesmo, isto é, os pares de opostos que constituem o todo da personalidade. A isso em primeiro lugar, pertence a consciência, depois o assim chamado inconsciente pessoal, e finalmente um segmento de tamanho indefinido do inconsciente coletivo, cujos arquétipos são comuns a toda humanidade. Alguns deles estão incluídos permanente ou temporariamente no âmbito da personalidade e adquirem, através desse contato, uma marca individual, como por exemplo – para mencionar algumas das figuras conhecidas – a sombra, o animus e a anima. O si-mesmo apesar de ser simples, por um lado, é, por outro, uma montagem extremamente complexa (JUNG, 2012, p. 361, 362).
Jung utiliza o formato da mandala, especificamente a representação do centro, para apontar as estruturas arquetípicas da psique humana. Ele considera a simplicidade do si-mesmo, mas também a complexidade da estrutura psíquica, uma vez que toda essa estrutura está de certa maneira relacionada ao centro. Neste sentido, para a Psicologia Analítica, dentre os arquétipos, o mais importante é o que Jung denominou de self ou si-mesmo, o qual é simbolizado de diversas maneiras, sendo a mandala uma delas. Este símbolo aparece espontaneamente no processo terapêutico dos pacientes de Jung. Tais imagens são analisadas por Jung, fornecendo-nos entendimento da condição psíquica de cada autor.
FARIA THEREZA, A.H. O simbolismo da Mandala. in Seminário leitura de imagens: a epistemologia de Nise da Silveira. Orgs. Eurípedes Junior e Marcia Gagliardi. Rio de Janeiro: Hólos, 2017.
Imagem: Edson Luiz Antunes / Museu Imagens do Inconsciente
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